sábado, 10 de outubro de 2015

Decepção, uma questão de alteridade?


Acho que tudo tem uma razão de ser, o Rivotril tem uma razão forte de permanecer na minha vida. Drogas não estão aí por acaso. Eu não queria ser dependente desse remédio, mas ele talvez me dê a segurança que o mundo não dá, não falo de autoestima, falo de uma segurança de ter uma verdade, aquela mesma verdade de Ana (do filme A Paixão de Ana), a verdade que nós tentamos crer. Penso que o Rivotril me dá uma verdade sobre o mundo, sobre mim, sobre o que sou, ele me deu um novo modo de agir e me comportar, quando saio dessa realidade me sinto enlouquecendo, como se eu perdesse a (minha!) verdade que rege a minha vida. Sem ele eu não suportaria, pois com ele já é bastante difícil, eu não deixo de sentir quando tomo esse remédio, eu só fico mais alheio a minha própria desgraça e a desgraça que me rodeia, quando a desgraça é enorme eu aumento a dosagem, e quando a alienação do remédio não funciona mesmo em doses excessivas, eu tento o suicídio.
Eu sou um significante do Outro, então esta bom. Eu tomo um comprimido e me sinto bem, logo, sentirei bem estar perto do Outro e terei bons significantes na estrutura. Eu tomei meia dose, mas logo penso que tive um péssimo dia, então deveria tomar a outra metade, isso vai se tornando uma máquina caça-níquel na qual você insere cada vez mais moedas. E sem controle!
Apesar do Rivotril a minha vida não é fácil, tem coisas irremediáveis, há dores que não cessam a não ser com o tempo, e talvez nem com este. Eu maldigo o remédio o tempo inteiro, ele não resolve os meus problemas, ele até me dá alguns, mas a segurança que ele me dá é a base que não tenho, o mínimo que alicerça todo o ser humano.
Sou louco? Talvez não um esquizofrênico, mas eu tenho graves problemas psicológicos. Eu não consigo definir e abranger a complexidade que se dá na minha mente, eu não existo em lugar nenhum, sou volúvel, meu humor varia rapidamente, minha concepção sobre mim mesmo não é fixa. Não pertenço a nenhum lugar, a ninguém, por isso me sinto desnorteado, faço de tudo para ter a certeza que a alguém eu pertenço, que eu existo em algum lugar, a prova que me valho e ver que estou em algum lugar na vida de alguém, então existo pois me localizo.
As pessoas podem ter o que quiser de mim, basta enxergar esse ponto e fingir que irão me identificar. Gosto de identificações boas, de ocupar bons lugares no simbólico, viro dependente de quem me dá uma identificação valorosa. Acabo eu mesmo, me desvalorizando. Às vezes eu luto com as pessoas embates psicológicos para ter essa boa valorização, eu ordeno tê-la como uma necessidade de respirar; os outros não entendem a minha luta e medem a mim por si mesmos, acabam me atribuindo significantes mesquinhos, que no universo deles eles imaginam, porque na verdade não se colocam no meu universo.
… (indo pegar a outra banda de Rivotril) Hoje eu quase surtei, descobri um segredo de alguém que sou muito próximo, era uma das coisas que eu nunca faria na vida, era uma coisa que se eu falar demais vou me envolver e dizer nas entrelinhas, porque isso me tirou a confiança e a verdade que eu acreditava. Eu me coloquei no lugar dele e tentei de todas as formas tentar me imaginar sendo exatamente construído como ele, até me inseri em seu contexto sócio-histórico, tentei justificar o seu ato perverso, até do conceito de perversão me afastei, tentei vê-lo com olhos de pena, mas não sei se existem justificativas pra enganar uma pessoa inocente. Eu tento enxergar o lado dele para não ter que sentir o grito da decepção toda vez ao lembrar dele, faço isso para a minha saúde mental, mas eu não consigo evitar o conflito disto com a minha verdade, que considera hediondo o que ele fez. No final das contas eu que mais me ferro nisso tudo, eu tento racionalizar e justificar o que ele fez, mas o meu sofrimento psíquico atrapalha a acepção total da minha racionalização, eu estou entre duas instâncias tentando não enlouquecer ou me ferir o menos possível.
Se o Rivotril fosse um remédio milagroso e tirasse essa neurose eu me sentiria melhor, mas ele não trata nada, é só uma muleta psíquica que preciso pra me alienar e continuar andando, mas tratar um conflito interno ele não trata. No meu conflito não há raiva, nem na posição relativista nem na posição emocional, mas há um desgosto e uma pena tão grande na posição emocional que eu me sinto sufocado. Mesmo que eu emule o mundo dele e tente justificar, é impossível sair do próprio mundo e abranger a totalidade do Outro, eu só suponho, quem viveu e quem sabe por que faz é ele, eu nunca vou saber, então é difícil aceitar porque a única ferramenta possível é a emulação de seu mundo, não a vivência e apreensão dele, as quais influenciam muito nessa anuência que eu preciso ter para acabar com esse conflito interno. A variável “sentimento” e a variável “reprovação da coisa que mais tenho horror” são importantes nisso, a união dessas variáveis esta fazendo as minhas tentativas de relativização serem infrutíferas, eu preciso me distanciar dele emocionalmente e ser frio, talvez até ir contra a minha verdade.
Engraçado que estou passando de modo inverso pela mesma coisa com uma menina, agora que estou na posição dela eu consigo entender o porquê dela repreender o que eu faço, e eu não devo cobrá-la. Faço uma coisa que ela abomina e ela não consegue ter êxito em sua relativização, assim como eu agora não estou tendo, penso que é porque ela se importa comigo, pois é seu sentimento que atrapalha. Agora meu foco é me distanciar emocionalmente dele, isso me ajudaria a resolver essa questão, vou buscar na psicologia behaviorista métodos para isso, eu preciso ser frio para resolver essa neurose ou vou acabar louco.

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